Pela primeira vez na vida ele estava seguindo uma dieta, fazendo tudo o que o médico mandava. Até exercício. Durante anos ele se lamentara por não ter um carro inglês.
- Por que inglês?
- Porque a direção é no lado direito. Você abre a porta e já está na calçada. Não precisa dar toda aquela volta.
E agora estava fazendo até exercício. Corria todas as manhãs. Comprara abrigo, tênis e saía para correr todos os dias antes do café. Chegava em casa eufórico.
- Descobri uma coisa genial.
- O quê?
- Oxigênio!
Cortara completamente os doces. Logo ele, que certa vez provara um enorme vexame. Estava caminhando na praça com a mulher - sob protestos -, quando de repente se inclinara para afagar a cabeça de um garoto. A mulher até estranhara, ele gostava de crianças mas não era dado àquelas demonstrações. Ele então se endireitara e a puxara pelo braço, forçando-a a apressar o passo.
- Vamos.
- Que pressa é essa?
- Eu roubei o pirulito do garoto. Vamos embora!
Mas era tarde. O garoto já dera o alarme, eles tinham tido que enfrentar uma falange de mães e babás indignadas, ele fora obrigado a devolver o pirulito.
Agora fazia abdominais no meio da sala. Volta e meia se olhava no espelho, alisava a barriga e perguntava:
- Diminuiu, hein? Não diminuiu?
Realmente, a barriga diminuíra. A mulher ficou tão intrigada que foi procurar o novo médico dele, sem ele saber. Precisava conhecer o responsável por aquele milagre. O médico disse que não havia milagre nenhum. Quando ela perguntou como ele conseguira que o marido se dedicasse tanto a perder peso, o que nenhum outro conseguira, o médico sorriu e disse:
- Com o sítio do Ferreirinha.
Contou que, durante a primeira consulta com o novo cliente, perguntava, como quem não quer nada, se o cliente conhecia o Ferreirinha. Não? Pois o Ferreirinha tinha um sítio. E todos os fins de semana o Ferreirinha reunia no seu sítio um grupo de amigos e algumas mulheres. O Ferreirinha conhecia muitas mulheres. Modelos. Misses. Grandes mulheres. E outras. E todo fim de semana tinha o que o Ferreirinha chamava de "A Corrida do Ouro". As mulheres saíam correndo pelos campos do Ferreirinha e os homens saíam correndo atrás. Quem pegasse uma ficava com ela para passar a noite. Os mais rápidos pegavam as mais bonitas. Os mais gordos e fora de forma não pegavam nenhuma. O cliente gostaria de entrar no grupo de amigos do Ferreirinha? Nada mais fácil.
O médico apresentava. Mas antes ele precisava perder peso. Entrar em forma. Para não fazer feio no sítio do Ferreirinha. Quando o cliente estivesse no ponto - prometia o médico - seria apresentado ao Ferreirinha.
- Mas - perguntou a mulher - o sítio do Ferreirinha existe mesmo?
- Nem o sítio, nem o Ferreirinha - disse o médico.
- E como é que o senhor faz quando eles chegam no ponto para serem apresentados ao Ferreirinha?
Pensava no marido com uma mistura de raiva e pena. Ele estava perdendo a barriga para correr atrás de mulheres no sítio do Ferreirinha, o cretino. Mas que decepção ia ter quando descobrisse que o sítio não existia, pobrezinho.
- É uma coisa engraçada... - disse o médico. - A senhora sabe que, até hoje, nenhum dos meus clientes pediu para ser apresentado ao Ferreirinha? Eu digo: "Acho que você já está pronto para o sítio" "Amanhã vou apresentá-lo ao Ferreirinha". Mas nenhum se acha em condições. Sempre querem treinar mais um pouco.
- Que raça - disse a mulher.
E o médico, mesmo sendo do gênero, teve que concordar:
- Que raça.
Luis Fernando Veríssimo